Friday, August 10, 2012

Optimus Alive 2012

Este ano a visita a Algés foi mais extensa do que em 2011. O cartaz era feito de poucos conhecidos e a proposta era essencialmente de descoberta. Essa abordagem pode ser ingrata para os conhecidos, uma vez que geram expectativas, e feliz para as descobertas, pela falta das mesmas.

Qualquer comentário ao que foi o festival terá de passar obrigatoriamente por comentar o que foi a presença dos Radiohead. Estou longe de ser um ferrenho conhecedor da banda, de modo que as minhas expectativas para o que poderia ser um concerto deles foram muito influenciadas pela expectativa que criaram à minha volta. E que expectativas eram essas? Para começar gente que por instantes esqueceu que tinha contas para pagar e foram a correr ajudar a esgotar o terceiro dia do festival. Outros, exilados em paragens mais frescas e sem férias para gastar, a lamentarem profundamente a sua incapacidade de fazerem oito horas de vôo (quatro para cada lado) para assistirem à banda. Uma olhadela atenta ao horário dos palcos permitia concluir que durante a actuação de Radiohead, mais nenhum palco estaria a funcionar. A noite prometia portanto ser épica. Prometia mas falhou a toda a linha! Provavelmente tem de se ser um indefectível adepto da banda para se conseguir apreciar todo o eventual esplendor colocado em palco. Radiohead foi, não há outra palavra, uma merda. Foi algo de tão mau, tão mau que ainda antes do final abandonei o local onde me encontrava para ir comer qualquer coisa bem longe deles. Posso assegurar que não fui o único a fazê-lo e nem sequer o primeiro, mas percebe-se perfeitamente a atitude das pessoas porque era decididamente muito cedo para se começar a fazer o chill out. Radiohead vieram como cabeças de cartaz quando, para fazerem o bonito número a que se prestaram, deviam ter sido atirados para as três da manhã como banda de chill out. Confesso que se estivesse num bar pequenino, sentado e a conversar com amigos, o concerto teria andado a roçar o muito bom. Num ambiente de festa e todo ele a transbordar energia, Radiohead foram os assassinos do ambiente, aquilo que em inglês se designa mood killers. Nessa fina arte de dar banho aos cães eles foram geniais até porque conseguiram juntar um alinhamento para koalas mordidos pela tsé-tsé a uma total inabilidade (falta de vontade?) para comunicar com o público. Quem tivesse assistido às nem-sequer-tentativas de interagir pensaria que os Radiohead seriam a banda chamada à última da hora para substituir um cabeça de cartaz. Ao lado das palavras isoladas de Thom Yorke (se entre músicas usou mais do que, assim por cima, três eu não ouvi), os sussuros impercetíveis de Robert Smith no dia antes soavam a poesia. Até a choraminguice de B Fachada conseguia ser enternecedora. A título de curiosidade, os SBTRKT conseguiram utilizar na sua apresentação ao público mais palavras numa frase, que os Radiohead no concerto todo. Salvou-se o bom trabalho vídeo, mas mais uma vez, isso podia eu ter num bar...

O que dificilmente teria num bar era a performance absolutamente irrepreensível dos portugueses PAUS. Só eles fizeram valer a pena ter estado neste dia no Alive. Sonoridade fresca, abordagem impecável e interacção com o público sem mácula. Muitos podem-me chamar louco, mas acho que os veteranos cabeças de cartaz não perdiam nada em descer do seu pedestal e aprender com estes novatos a tomar o pulso à plateia. B Fachada trouxe lá mais para a tarde o seu karaoke cheio de ritmos calmos e introspectivos. Comunicou muito com o público, mas o papel de coitadinho a entre cada duas músicas não combinava com aquele final de tarde à beira rio. De Márcia, que havia actuado momentos antes só ouvi parte de uma música. Não gostei do que ouvi e portanto fui para outras paragens, mesmo a tempo de ouvir o final de Warpaint e de lamentar não ter ouvido todo o concerto. Os instantes de Maccabees que ouvi também foram interessantes, mas havia alguma expectativa de ir arranjar um lugar para a grande banhada...

No capítulo do "esperava um bocadinho mais" terá de se recuar um dia e falar dos Florence and The Machine. Esperava-se mais, porque acima de tudo se esperava que aparecessem! O ritmo a que alguns artistas recentes ficam com súbitos problemas vocais faz pensar que o regime saudável de outros tempos é bem mais saudável. Perguntem aos Rolling Stones que eles explicam... Para tapar a cratera lá se chamaram os Morcheeba. Muitos dos ouvido mais jovens ficaram frustrados, mas têm de ser perdoados. Afinal daqui por quinze anos será a Florência deles que será chamada para tapar buracos! Sim rapaziada, houve uns tempos em que os Morcheeba eram para nós o que Florence and the Machine é para vocês! O alinhamento foi agradável, mas não aqueceu muito a assistência, até porque soprava uma brisa do rio que destoava do dia quente.

Se as orelhas de há quinze anos começaram a aquecer com Morcheeba, as de há 25 escaldaram com o que se seguiu. The Cure podiam muito bem ter tocado toda a sua discografia que no final não chegaria. A multidão de indefectíveis custou a arrancar, mas os toadas mais mornas tiveram o condão de refrescar os sectores menos condensados da assistência, fustigados que eram por faixas introspectivas e uma aragem fresca. 

Nada fresca, mas sim muito escaldante, foi actuação dos Blasted Mechanism. Com álbum novo na mala e prestes a celebrar mais um aniversário sem esse monstro do palco que era o seu primeiro vocalista, a banda apresentou um registo onde os temas novos se integram muito bem nos velhos, apresentou arranjos diferentes, mais em linha com a sonoridade presente, cativou todo o palco secundário e mostrou que serem atirados para as três da manhã foi uma tremenda injustiça para uma banda da casa. Não que isso importasse! A interacção com o público foi total e se antes havia uma figura de destaque, neste momento há um colectivo de destaque, sempre a puxar para cima a energia do público!

Antes nesse dia, os Awolnation mostraram que a sua música não se fica pelo muito tocado Sail. Há ali muita energia e músicas para abraçar o parceiro do lado. O vocalista vestiu impecavelmente a pele de mestre de cerimónias e saí do concerto bastante satisfeito.

Outras aragens, mas estas mornas a dar para o escaldante, minaram o concerto de Stone Roses na primeira noite do festival. Não é que o alinhamento fosse fraco, não é que faltasse entusiasmo na banda ou nos presentes, simplesmente foi injusto pô-los a tocar ao mesmo tempo que a malta se acotovelava (no bom sentido) na outra ponta do recinto para ouvir (muitos não conseguiriam ver) os Buraka Som Sistema. Passar junto ao palco secundário e não começar a "dançar" (usemos o termo num sentido lato, no qual se incluem coisas como "abanar-se") era impossível. Acredito mesmo que as próprias árvores e pedras da calçada estavam a dançar, tal o contágio que emanava do palco.

Este dia acabou por ser mesmo para mim o mais interessante. Apesar de apenas ter assistido a partes dos concertos, Miúda e Dum Dum Girls brilharam muito, mas a minha razão de estar no recinto no primeiro dia foram os suecos Refused e não desiludiram. Punk agressivo q.b., uma mensagem aqui e ali e a mesma música de sempre, a encorajar um dos melhores moshes onde tive o prazer de estar nos últimos anos.

Um comentário à organização. Já o ano passado, em que só fui um dia, havia ficado um profundo sentimento de injustiça quanto à arrumação dos palcos. Desta vez o sentimento cresceu na directa proporção do número de dias em que lá fui, mas não só. Mais do que a sobreposição de concertos interessantes, por mais do que uma vez se revelou que havia bandas escaladas para o palco errado. 

Na categoria sobreposição houve melhorias, mas não se evitou o momento quase confrangedor ver que Stone Roses tinha uma mancha a assistir quase tão grande como... PAUS! Em grande parte porque muito público se deslocou do palco principal para o palco secundário, para os lados do palco secundário, para trás das barracas de comida que tapavam a vista para o palco secundário, enfim... Para onde lhes fosse possível serem contaminados pelos ritmos de Buraka.

No capítulo "banda certa no local errado" entram direitinhos, lá está, os Buraka. Com gente que ia até bem longe do palco, a banda da Buraca justificou um lugar num local mais amplo. Se a quantidade de gente por si só não chegasse, o facto de puxar mais gente com o passar do concerto, ao contrário de outros cabeças de cartaz, fá-lo-ia. Ainda no primeiro dia, os LMFAO levaram muitos pais a levarem a sua prole pela mão para assistir ao concerto. Agora, eu gosto muito dos Refused e adorei o concerto deles, mas claramente a sonoridade dos suecos presta-se muito mais ao recato de um palco secundário do que a actuação de uma das bandas quentes do momento. Ficou, no final do terceiro dia, também o sentimento que houve má gestão dos cabeças de cartaz. Quando olho para o que foi o festival, se Stone Roses tocasse no terceiro dia e Radiohead no primeiro, todo o sentimento poderia ter sido diferente. Se, se, se...

No capítulo transportes, lamento profundamente que a malta da Margem Sul continue a ser maltratada. Como se não bastassem os cortes do Governo nos barcos, a organização manifestou a incapacidade (eu gosto de pensar que não conseguiram, mas...) de arranjar barcos especiais combinados com os últimos comboios/autocarros, mas tirando esse particular parece-me que houve um investimento em facilitar as acessibilidade ao festival.

Concluindo, um festival sempre agradável que começa a granjear adeptos em paragens mais distantes, mas que me deixou com muitos "ses" e isso não me deixa elevá-lo aos píncaros...



PRÉMIO "Quero o meu dinheiro de volta!"
-Radiohead
-Márcia

PRÉMIO "Eu até estava cansado e a precisar de descanso."
-The Cure
-Morcheeba
-B Fachada

PRÉMIO "Não conhecia estes tipos, mas o bilhete começa a parecer bem comprado."
-Awolnation
-Miúda
-Dum Dum Girls
-Warpaint

PRÉMIO "Agora sinto-me Alive!"
-Blasted Mechanism
-Buraka Som Sistema
-Refused
-PAUS (chamemos-lhe Banda Revelação)

Thursday, August 9, 2012

O Bom Demónio - Nikos Kazantzakis



O título O Bom Demónio dirá muito pouco ao público em geral. No entanto, o nome da personagem principal depressa fará soar alarmes de reconhecimento. O nome: Alexis Zorba. Esse mesmo, a figura que ficou imortalizada por Anthony Quinn no filme Zorba, o Grego, é a figura a que o título desta obra se refere.

No momento em que fechei este livro, tudo o que ele narra faz sentido de uma forma estranha. Estranho porque creio que dificilmente o livro apelaria aos meus sentido se o país onde me encontro não tivesse dias de Verão com temperaturas bem abaixo dos vinte graus, onde a chuva e o vento são as únicas incógnitas sob as nuvens, onde a comida não tem sabor e o trabalho é encarado como a redentora cura de todos os males. Se não me encontrasse rodeado dessa filosofia do viver para trabalhar, o livro dificilmente faria sentido.

Pensando melhor, o livro faz sentido talvez um pouco por todo o lado, muito dado ao momento em que vivemos, e será difícil não olhar para ele como literatura subversiva de todos os valores que nos têm sido papagueados nos últimos anos.

Não é que a obra não incida sobre a amizade entre o narrador e Zorba, essa amizade tão bem passada para a tela por Alan Bates e Quinn, mas o livro é mais, muito mais! Fazendo uso das ferramentas ao seu dispor, Kazantzakis recorre ao seu eu literário para nos contar o que foi para ele crescer e conhecer o verdadeiro Zorba. Com frases simples e facilmente acessíveis, Kazantzakis torna todo o livro um tratado de Filosofia, onde o discípulo vai confrontando o mestre. Confronto é a palavra chave do livro, tal a frequência e tais as formas que este toma. Ele é o saber teórico contra o empírico, os livros do narrador contra a vida de Zorba. Ele é a juventude contra a idade, os sonhos contra a realidade, o mudar o mundo contra o ter sido mudado, a ilusão contra a prudência, a inocência contra a matreirice. Zorba não é um personagem qualquer, ele podia ter sido o nosso pai. Zorba é um pai para o narrador, é a figura paternal que o ajuda a passar da adolescência para a idade adulta.

Uma leitura de O Bom Demónio à luz do momento que vivemos não deixará de notar como esta obra transpira todo um ar de trabalhar para viver. Zorba surge como um farol de alegria, mesmo nos momentos maus Zorba aparece como o homem que aprendeu a dar a volta e encarar sempre pela positiva. Zorba é a figura que nos diz que por muito que a escola nos ensine, nunca saberemos nada enquanto não nos fizermos à estrada, enquanto não cairmos e nos levantarmos. Num momento em que figuras engravatadas, mas ainda de fraldas, nos dizem que o nosso fim é morrermos a trabalhar para eles, este livro é um hino à rebelião e portanto uma leitura indispensável.

Tuesday, August 7, 2012

O que está para vir.

 Passadas as féries é altura de abordarmos o que de agradável se passou nessas férias. Do ponto de vista deste blog haverá novidades.

 Haverá um comentário ao que foram três dias no Optimus Alive, uma quebra com a rotina e hipótese para rever amigos de longa data e de há muito tempo, para agradáveis surpresas e para desapontamentos.

 Em termos de matéria escrita haverá ainda espaço para comentar as obras que recentemente se fecharam. Azincourt, um romance histórico de Bernard Cornwell que relata a batalha da Guerra dos Cem Anos, que decorreu no local com o mesmo nome, e que marca o regresso do autor às histórias com o arco inglês. Outro volume que se fechou foi O Bom Demónio, de Nikos Kazantzakis romance que conta como personagem principal com um tal de Alexis Zorba. Para quem desconhece, recomenda-se o visionamento do filme Zorba, o Grego.

 As férias serviram ainda para adiantar as leituras do romance gráfico The Sandman, de Neil Gaiman, e de adiantar a leitura da Colecção de Livros Licenciosos, da editora Tinta da China, coordenada por António Ventura, pelo que será expectável que até ao fim do ano se comentem estes blocos.